Ausência de cor
A mulher, sentada em frente ao homem, não sabia o que fazer com o presente que pendia de seus dedos.
- Gostou? – perguntava ele com os olhos dos mais suplicantes.
Num misto de altivez e pena, a mulher apenas sorria, sem saber o que dizer.
- É pra você.
Ela sabia. Mas realmente não tinha o que dizer. Falar o quê, quando não se ama? Quando prefere uma cama a duas escovas?
Devolveu o olhar ao homem ajoelhado e apertou-lhe, angustiada, a mão, sentindo com suavidade o toque da pele áspera.
Como se diz assim: quero ficar só? Prefiro eu a nós?
“Não quero mais arrastar esse peso da gente nas minhas costas.”
Foi o que pensou, mas só conseguiu arrumar uma mecha do cabelo dele que pendia, suada, do meio da testa.
Mas tinham sido dois já fazia era tempo. E ele entendeu.
Levantou-se, passou a mão pelo queixo dela e se despediu sem olhar pra trás. Como Lot.
Perdeu-se ela por entre pensamentos, procurando segurar-se em sentimentos felizes. Como
Wendy?
Mas era tarde. Ouviu a porta batendo e, instintivamente, correu pra janela.
Do lado de baixo, ele cambaleava. Sem conseguir manter uma linha reta, caiu arbóreo ao chão.
Na janela, a moça, conformada, mirava nostálgica o coração ainda quente em suas mãos.